20.04.2020 Interessa-me particularmente o ensaio e o diálogo III
20.04.2020
Interessa-me particularmente o ensaio e o diálogo. Já reescrevi
este segundo-início mais vezes que o habitual. Vamos lá, sem receio de ser
apenas descritivo e mais nada. Vamos lá contar mesmo como a coisa se passou.
Sem medo (do ridículo).
Hoje quando
chego a casa após a nossa tentativa frustrada de passeio fitossanitário – começou
a chover – vejo que o Rui me enviava pelos canais possíveis o Diário da Peste
do Gonçalo M. Tavares para o Expresso. Parece que como o nome o indica, é um
diário para estes tempos da peste. Há quem também esteja a fazer o seu. Como de
costume, quando as recomendações vêem dali, abri sem hesitar.
Interjeição.
Mostrei à Sílvia.
Confidencializou-me que o lia às escondidas e que tinha optado por não mo mostrar.
Não era preciso mais explicações.
Devorei com uma
gulosa voracidade três ou quatro diários e obriguei-me a parar.
- Ainda bem que
não mos mostraste. Estavas-me a poupar daqueles logos períodos de insegurança.
E eu que finalmente
tinha ganho coragem.
Chamei todos os
nomes possíveis ao Rui na caixa do Whatsapp e vim escrever isto à pressa, antes
que..
- Para que é que
mo mostraste? Logo agora.
“O
reconhecimento da ignorância uma das mais belas e seguras provas de juízo que
se me deparam”, diz aquele que me persegue, o sier-do-ensaio. Não sei se é
ignorância. Eu já tinha começado o Jerusalém. Deixo tantos livros a meio, sem
qualquer pudor.
Não fui tocado
(ainda) pelo Gonçalo M. Tavares.
Parece que foi
por acaso: a semana passada peguei n´”O Senhor Breton”. Foi daqueles livros que
os dedos até levaram a melhor até meio, mas não me lembro de nada.
“Se sou homem de
alguma leitura, também o sou de nenhuma memória”, mas, novamente não sei se foi
o caso. Há tantos livros, e filmes, e viagens, e conversas que apenas passam
por nós. - acabei essa noite a rever o 2046 do Wong Kar-Wai e contrariando o
seu antecessor, acho que retive tudo.
Há autores assim.
Ou há momentos assim, sei lá.
Tenho aqui a página
aberta à espera que acabe isto. No Expresso vou sempre a correr ler o Tolentino
antes de passar apressadamente pelas restantes capelas. Há quanto tempo o Gonçalo
M. Tavares lá escreve?
Curioso que
ainda ontem a Sílvia, à minha frente - sem mo esconder desta vez - estava a ver
o Carlos Vaz Marques a entrevistá-lo. Sabe, ou sabia, que lhe sou imune.
Já ouvi a Sílvia
conversar com a Inês sobre ele. Nunca me chamaram para a conversa, ou terão
chamado?
Acontece até -
ainda mais ridículo - que já fui comprar, sozinho, um livro dele para oferecer
ao Hélder. Folheei vários, li sinopses, contracapas, excertos do catálogo inteiro.
Como é que lhe
fui imune tanto tempo?
Bem, já
despachei isto. Agora vou ler e ler e ler, e é ver quem tem razão.
Das duas uma: ou
bloqueio por vários dias; ou vai começar a histeria que finalmente encontrei um
mestre para me guiar o caminho - que já nem preciso do Montaigne.
Para já, tenho
apenas este entusiasmo desavergonhado deste sentimento pueril de ir passar o
final da tarde em êxtase.
Mas antes vou mudar
esta página para o teletrabalho, continuando o processo de actualização para
este novo-normal, que já só faltam 6 anos 11 meses para o louco perder o medo e
sair da quarentena.
- E se agora vou
ler e fico novamente imune?

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