01.04.2021 Interessa-me particularmente a vaidade
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I
Vaidade! Foi a
vaidade que me trouxe aqui. A mim? Não! Eu não escrevo. Eu só digo! Por isso, esta
vaidade não é a minha. Ou é? A vaidade do diseur. De dizer o texto, explorando
a destreza poética de cada palavra tornada som. Que maior vaidade senão a
vaidade da voz? Há outras? Há! A da escrita. Do pensamento, feito ensaio, feito
diário, feito diálogo, feito voz. Feito…podcast.
II
E então a
história é simples. Dois mil e vinte foi o que foi. E o que é que se faz:
escreve-se: a peste, a paranoia, o desalento, o desencanto, a melancolia, a
raiva, o descontrole emocional, erótico, político, íntimo, de um fim do mundo,
dento do fim espacial de qualquer um de nós: a sua casa. E há lá coisa mais, arquitectura,
que uma casa? A arquitectura, pois! Eu sou arquitecto. Quer dizer, eu sou
arquitecta. Ai! O que vale é que somos os dois. Ou os três, porque as palavras
escritas e as palavras ditas têm de ser ligadas. Com arquitectura? Também. E com
música. Há la maior vaidade do que a música?
III
“A” conheceu “R”
nos finais do último milénio, numa obscura e sedutora sala de chat do
saudoso e extinto mirc. “A” e “R” encontraram-se em dois mil e dois, nos
Jardins de Serralves, numa deslocalizada aula de Desenho I, da Faculdade de
Arquitectura da Universidade do Porto. Desde esse fatídico dia, “A” e “R” são
inseparáveis na ausência. “A”, faz de tudo para sair do Porto tão raramente
quanto impossível. “R”, faz de tudo para estar no Porto tão possível quanto
raramente. “A” e “R” são inseparáveis na distância. Juntos, já se tinham, sem
qualquer réstia de imodéstia, separado, por exaustão.
IV
“T”, por
vicissitudes da sua jovialidade e da pura sorte, durante os tempos da Faculdade
de Arquitectura, não conheceu nem “A”, nem “R”. “A” e “T” encontraram-se
algures em dois mil e treze na SCAR-ID, “a Porto based store-gallery
specialized in contemporary and experimental design and art.”, que é como
quem diz: uma loja. “A” era curador do espaço e “T” era designer na WEK, “a
contemporary jewellery brand that explores non-conventional materials,
reinvents the use of common ones, and reconciles tradition and innovation”, que
é como quem diz: uma marca. Se hoje “A” e “T” são ainda curadores e designers,
bem, isso depende da longevidade deste podcast, naturlich!
V
Ainda que “R”
esteja mesmo aqui no país ao lado, a compor, a tocar, a filmar e a pensar, “T”
curiosamente ainda não se encontrou com “R”, Se é que o podemos dizer. Porque
em tempos de peste, os encontros já deixaram de viver indexados ao toque, ao
cheio ou ao riso. Quanto ao olhar, sim, “R” e “T” podem ver-se – mas não é a
mesma coisa, pois não? “R” e “T” contudo, dispõem de uma vantagem particularmente
interessante: podem ouvir-se.
VI
E a vaidade? Ai,
que já me esquecia da vaidade! É que estava a interessar-me particularmente contar
como estas pessoas se conhecerem. Mas pronto, deixa lá! Fica para outro
episódio. Isto também só nos diz respeito a nós e à nossa ostensiva, leviana,
inconstante e inútil vaidade, feita, podcast.
VII
Vaidade
publicada. Apenas porque me interessa particularmente, quer dizer! apenas porque
preciso visceralmente dizer que estou velha, irónica, conservadora, decadente,
cáustica, diarista, desempregada, ilegal, política, pessimista, egoísta,
visceral, historicista, publicada, atípica, proprietária, ensaísta, resistente,
panfletária, letrista, paranoica, equilibrada, melancólica e snobe. Eu?
Não. Ora essa, que ideia. Eu só digo!
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