29.06.2021 Interessa-me particularmente a transparência


 
I

E um colegiado “porreiro pá” foi então substituído por um servil (ou transparente, lá chegaremos) “Já posso ir ao banco?”. Durante a última semana discorreu-se sobre tão importante achado: uma nova insígnia que nos caracteriza enquanto portugueses. Somos o fim da linha de uma ordem vigente que serve um único propósito, colectar (ou inventar) dinheiro e distribuir. O virtuoso lugar dos valores, da colaboração e da interajuda (a Europa das uniões) é hoje pouco mais do que um conveniente banco, rondado pelas suas mais impacientes filiais.

II

Mas afinal, o “Já posso ir ao banco?” esteve longe dessa imagética subalterna, aduladora e obediente. Antes, António Costa mostrou-nos dentro do lago, a boiar tal como qualquer outro consorte da UE: eis ao que vimos – todos - ao dinheiro. Posso levar o meu? Claro que isto não é em nada melhor do que a posição submissa do desvalido que desesperado roga por amparo. É, pelo menos, mais transparente que a habitual velatura de cordialidade que nos habituamos. 
Eis ao que venho, sem hipocrisias, venho apenas pelo dinheiro! Sou parte do clube, uma parte pequena e venho reclamar a minha - e já!

III

Sendo mais transparente e menos servil, o nosso novo lema-oficial rapidamente desmonta qualquer propósito ideológico. Descarbonar e digitalizar são apenas efeitos secundários de retórica. É o banco que nos interessa particularmente enquanto conta-corrente de um dia-a-dia não gerido, mas percorrido na suficiência. É o que temos! E não consta que vá melhorar.

IV

Mas para melhorar (se tal fosse possível), permitem-se alguns, de um lado, sugerir entregar a pecúnia directamente ao contribuinte que com ele se espera que fará maravilhas na redistribuição gota-a-gota; ou por outro, colocar os fundos nas mais valentes forças-vivas, escolhidas por portfólio pela sua visão periférica e aguardar os dividendos da ambição. 
Mal por mal, são ambas melhores do que a viciada estratégia em polvo que nos aguarda na próxima década.

IV

E sobre a peste, a Europa desmascara-se morosamente, enquanto por aqui, acompanhando a mesma leitura que damos ao futebol, passamos rapidamente dos melhores (do mundo) aos piores (da história).
Mesmo que as condições o permitissem, não haveria por cá alguém capaz de defender o desmascaramento. O Português encontrou na máscara o seu lugar de distinção e identidade. É um jogo de tapa-destapa em frente ao amigo e ao rival. 
Se um Português considerar o outro limpo e digno do seu afecto, desmascara-se e incentiva à transparência. Se ao invés, é o desdém que impera, para afastar o indesejado excursionista da sua vista, subleva-se da regra, da lei, da moral e dos bons costumes, numa soberba securitária e higienicista  e exige pedantemente o cumprimento cabal das mais arbitrárias normas.  
A máscara nunca serviu afinal como arma de combate ao vírus, mas para ferramenta de gestão do ambiente comum.

V

Quando acaba a peste? Para mim, a peste acaba no dia em que puder respirar no meu deambulatório privado (a cidade), que é como quem diz: quando puder tirar a máscara na minha deriva urbana.
É muito difícil fazer ver a quem consegue respirar para dentro de um pano que há uns que não conseguem tal feito da mais elementar sobrevivência. Mais do que uma questão política e como tal simbólica, ou higiénica, ou paranoica, a máscara pode, ser um abcesso. 
Quando acaba a peste? Para alguns já acabou, concordantes com os males-menores de uma qualquer normalidade. Para outros, só acabará com a extinção natural do vírus, bem depois do último morto, quando o último ferido for considerado saudável (pelo menos daquilo). Enquanto a coisa não acaba, vou continuando a tentar tapar-me. E tem-me corrido bem o jogo!

VI

VII

Sexta vou à pica. Quando acaba a peste para ti?


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