26.11.2021 Interessa-me particularmente a complexidade e a contradição
I
Costumo chegar tarde. Não atrasado, nem depois, simplesmente, ligeiramente mais tarde. Habituei-me
a entender a minha posição de tard-venue como uma virtude. Chegar tarde
é ainda chegar a tempo e com a convicção da certeza reforçada. Se aqui cheguei
é porque tinha mesmo que vir.
Cheguei tarde
ao LIVRE. Vim inicialmente pelo Rendimento Básico Incondicional e
encontrei um espaço particularmente interessante que me faz protelar a minha
habitual melancolia: afinal, já não estou assim tão politicamente órfão.
Assinei a
declaração de princípios do LIVRE, mas continuo independente.
Assumo-me então
(também) como libertário, europeísta, universalista, ecologista e solidário.
À esquerda, prefiro antes o progresso, símbolo que comunica com menos fantasmas
(e outros traumas). Acredito na imperfeição intelectual do ser humano e
por isso num estado (social) capaz de corrigir os estorvos da sorte e
todas as complexidades desta nossa condição humana, mas apenas na medida
necessária. Ao contrário do que o meu temperamento deveria prever, sinto-me bem na
artificialidade programada da Declaração dos Direitos Humanos e a repetir
o ideias da Revolução Francesa.
Afinal, já não
estou assim tão politicamente órfão.
III
Mas tal como
dizia o grande teórico do conservadorismo Michael Oakeshott, também eu padeço
(infelizmente) da tal disposição conservadora, o que é uma grande chatice
para este novo caminho. Como consolo, bem-sei que a definição do Oakeshott, que
maravilhou os irónicos dos anos 80, está particularmente bem-esgalhada para que
cada um nela se acomode à sua maneira.
Apesar de me extasiar
com (a utopia do) o RBI, eu não sou um radical, nem desejo visceralmente a
mudança. Tenho até conseguido habilidosamente contornar a economia de
mercado em que vivemos e encontrar – nos dias que o meu cepticismo me
permite - algum entusiasmo no mundo que me rodeia. Por enquanto!
IV
Nestes últimos
dias andei aqui no Porto pelas primárias do LIVRE. Um independente com
restos de conservadorismos (estéticos) mal resolvidos, carregado de melancolias
e cepticismos, caiu de “para-quedas” num mundo que (ainda) não era o dele.
Ainda.
E foi, particularmente
interessante. As primárias do LIVRE, abertas a todos, são um espaço de liberdade
e igualdade, capaz de fazer sentir o mais imberbe para-quedista, ao mesmo
nível do mais traquejado militante.
V
Quero agradecer
a todos no LIVRE por me terem recebido tão bem.
Afinal, pertenço
aqui. Não é apenas uma fraqueza que de quatro em quatro anos se me dá.
VI
Candidatei-me às primárias do LIVRE com estas contradições. São as minhas. E este foi lado que escolhi representar. Aos 37 anos interessa-me particularmente participar da conversa da democracia. O LIVRE é hoje um partido de menos de 1%. Mas as nossas ideias são demasiado importantes para ficarem neste nosso nicho.
VII
“… eis que o LIVRE me aparece como uma bolha de moderação, capaz de convocar os mornos para o combate possível. Nestas coisas das ideologias políticas, nada me satisfaz tanto como uma transviada leitura da célebre frase do Gramsci: pela razão, sou pessimista, um céptico que não acredita na humanidade, mas pelo vontade… e lá votarei no LIVRE.” E pela vontade, cá estou no LIVRE.
E como sofro de um “irracional interesse particular por noites eleitorais”, parece que desta vez não posso ficar no sofá enquanto telespectador do caos. Afinal, desta vez, vou fazer parte do caos.
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